Provimento Nº 162 de 11/03/2024
Regulamenta o art. 47-A do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ), acerca da celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre a Corregedoria Nacional de Justiça e magistrados, servidores e serventuários do Poder Judiciário ou delegatários de serventias extrajudiciais, e dá outras providências.
O CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais e regimentais,
CONSIDERANDO que o ordenamento jurídico brasileiro adota, de forma ampla, a predileção por soluções adequadas para a prevenção e resolução de conflitos instalados no âmbito judicial ou extrajudicial, sobretudo de ordem consensual e não punitiva (e.g. Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais – Lei n. 9.099/1995; art. 28-A do Código de Processo Penal; Lei de Improbidade Administrativa, com a redação que lhe foi atribuída pela Lei n. 14.230/2021; Lei n. 13.140/2015 – Lei da Mediação; art. 3º, § 2º, e art. 174 do Código de Processo Civil);
CONSIDERANDO os termos da Resolução CNJ n. 125/2010, que dispõe sobre a “Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário”;
CONSIDERANDO que a Recomendação n. 21/2015 da Corregedoria Nacional de Justiça fomenta “a adoção de mecanismos de conciliação e mediação nos procedimentos preliminares e processos administrativos disciplinares em trâmite no âmbito do Poder Judiciário cuja apuração se limite à prática de infrações, por servidores ou magistrados, caracterizadas por seu reduzido potencial de lesividade a deveres funcionais”;
CONSIDERANDO que o art. 47-A, § 5º, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ) delegou à Corregedoria Nacional de Justiça a regulamentação do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), como instrumento de resolução consensual de conflitos de ordem disciplinar e alternativa à abertura de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) ou à aplicação de sanções a magistrados, servidores e serventuários do Poder Judiciário ou delegatários de serviços notariais e de registro;
CONSIDERANDO, por fim, a necessidade de uniformização de procedimentos em todas as corregedorias dos tribunais submetidos à fiscalização do Conselho Nacional de Justiça (CNJ);
RESOLVE:
Art. 1º Fica instituído o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) como mecanismo de não persecução disciplinar e de resolução consensual de conflitos cuja apreciação se insira nas atribuições da Corregedoria Nacional de Justiça.
Art. 2º Em quaisquer procedimentos, recebidos ou instaurados de ofício pela Corregedoria Nacional, não sendo caso de arquivamento e presentes indícios relevantes de autoria e materialidade de infração disciplinar de reduzido potencial de lesividade a deveres funcionais, nos termos do art. 47-A do RICNJ, o Corregedor Nacional poderá propor ao investigado a celebração de TAC, desde que a medida seja necessária e suficiente para a prevenção de novas infrações e para a promoção da cultura da moralidade e da eficiência no serviço público.
§ 1º Considera-se infração disciplinar de reduzido potencial de lesividade a deveres funcionais a conduta de cujas circunstâncias se anteveja a aplicação de penalidade de advertência, censura ou disponibilidade por até 90 (noventa) dias.
§ 2º Para a celebração do TAC, o magistrado deve preencher os seguintes requisitos subjetivos:
I – ser vitalício;
II – não estar respondendo a PAD já instaurado por outro fato, no CNJ ou no tribunal de origem;
III – não ter sido apenado disciplinarmente nos últimos 3 (três) anos, consideradas as datas da nova infração e do trânsito em julgado da decisão que aplicou a pena;
IV – não ter celebrado TAC ou outro instrumento congênere nos últimos 3 (três) anos, consideradas as datas da nova infração e do cumprimento integral das condições anteriormente ajustadas.
§ 3º Na análise da adequação e da necessidade da medida, o Corregedor Nacional poderá avaliar, entre outros fatores, os antecedentes funcionais, o dolo ou a má-fé do investigado, o tempo de exercício da magistratura, as consequências da infração, os motivos da conduta, o comportamento do ofendido e a natureza do conflito, se está relacionado preponderantemente à esfera privada dos envolvidos.
Art. 3º Com a aceitação do TAC, o investigado se compromete a reconhecer a inadequação da conduta a ele imputada e a cumprir as seguintes condições, que poderão ser adotadas isolada ou cumulativamente:
I – reparação do dano, salvo absoluta impossibilidade de fazê-lo;
II – retratação;
III – correção de conduta;
IV – incremento de produtividade;
V – frequência a cursos oficiais de capacitação e aperfeiçoamento;
VI – suspensão do exercício cumulativo e remunerado de funções judiciais;
VII – suspensão do exercício remunerado de funções administrativas ou de caráter singular ou especial.
§ 1º Poderão ser acordadas outras condições, desde que alinhadas ao propósito de prevenir novas infrações e de promover a cultura da moralidade e eficiência no serviço público.
§ 2º O Corregedor Nacional de Justiça poderá decidir pela utilização da Justiça Restaurativa, hipótese em que as condições serão apenas as estabelecidas no plano de ação eventualmente celebrado, a partir de procedimento restaurativo.
Art. 4º O incremento de produtividade consistirá no acréscimo de até 50% de sentenças de mérito e/ou de audiências a ser cumprido no decorrer de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, considerada como base de cálculo a produtividade do magistrado nos últimos 12 (doze) meses.
Parágrafo único. Na definição do percentual de acréscimo a que faz referência o caput, deverá ser considerada também a produtividade média de juízos com a mesma competência ou competência similar à exercida pelo investigado.
Art. 5º A frequência a cursos oficiais de capacitação e aperfeiçoamento consistirá na aprovação em cursos oferecidos por escolas da magistratura, com carga horária mínima de 40h, a serem cumpridas no prazo máximo de 12 (doze) meses, de preferência com temática relacionada à falta disciplinar.
Art. 6º As suspensões de que tratam os incisos VI e VII do art. 3º perdurarão pelo período de 1 (um) a 3 (três) meses.
Art. 7º Havendo indicativo de cabimento de TAC em procedimentos de competência da Corregedoria Nacional, será requisitada do tribunal a que estiver vinculado o magistrado certidão disciplinar e de todas as funções administrativas, singulares, especiais ou judiciais ocupadas nos últimos 12 (doze) meses, inclusive a título de cumulação, bem como sua produtividade individual e a produtividade média dos juízos com a mesma ou similar competência em igual período.
Art. 8º Preenchidos os requisitos do art. 2º, o investigado será intimado para que se manifeste acerca do interesse na celebração do TAC, devendo ser a ele encaminhado, desde já, o esboço das condições que figurarão no instrumento do acordo.
§ 1º O instrumento do TAC deverá conter:
I – a qualificação do magistrado;
II – os fundamentos de fato e de direito para sua celebração;
III – a descrição das obrigações assumidas;
IV – o prazo e o modo para o cumprimento das obrigações; e
V – a forma de fiscalização das obrigações assumidas.
§ 2º Havendo concordância sem reservas pelo investigado, o TAC será homologado pelo Corregedor Nacional.
§ 3º O TAC poderá ser homologado por escrito nos autos ou por audiência específica, a critério do Corregedor Nacional.
Art. 9º Não havendo concordância com os termos do acordo, o procedimento seguirá curso normal, com intimação do investigado para apresentação de defesa prévia, nos termos do art. 14, caput, da Resolução CNJ n. 135/2011 e do art. 70 do RICNJ.
Parágrafo único. Ocorrendo a hipótese do caput, primeira parte, o Corregedor Nacional, antes da submissão do procedimento ao Plenário, poderá convocar, a seu critério, audiência de conciliação ou mediação, observado, no que couber, o disposto no art. 166 do Código de Processo Civil.
Art. 10. O despacho a que se refere o art. 8º suspende o prazo prescricional para a responsabilização disciplinar do investigado.
Art. 11. Cumpridas todas as condições estabelecidas no TAC, será declarada extinta a punibilidade do investigado pela falta administrativa, com o arquivamento definitivo dos autos.
Parágrafo único. Durante o cumprimento do TAC, não correrá a prescrição para responsabilização disciplinar do investigado.
Art. 12. Havendo indícios de descumprimento de condições estabelecidas no TAC, o investigado será intimado para, em 5 (cinco) dias, apresentar justificativas.
§ 1º Aceitas as justificativas, o acompanhamento do acordo retomará o curso, podendo o Corregedor Nacional, a seu critério, prorrogar o prazo final para o cumprimento, ajustar com o investigado outras condições ou modificar as já existentes.
§ 2º Não apresentadas ou não aceitas as justificativas, declarar-se-á rescindido o acordo, hipótese na qual serão aplicadas ao investigado as penas de advertência ou de censura pelo Corregedor Nacional de Justiça, ou de disponibilidade por até 90 (noventa) dias pelo Plenário.
§ 3º Caberá recurso administrativo ao Plenário da decisão do Corregedor Nacional que aplicar pena de advertência ou de censura, devendo o investigado apresentar todas as teses de defesa nas razões recursais.
§ 4º Havendo indicativo de cabimento de pena de disponibilidade por até 90 (noventa) dias, antes da submissão do processo ao Plenário, o investigado será intimado para apresentar defesa.
§ 5º Em caso de rescisão do TAC por força do disposto no § 2º deste artigo, não decorrerá nenhum direito ao investigado do cumprimento parcial das condições estabelecidas no acordo, seja de que natureza for.
Art. 13. A celebração de TAC não tem caráter de pena disciplinar, tampouco constitui direito subjetivo do investigado, e somente constará dos registros funcionais do magistrado pelo período de 3 (três) anos, a contar da declaração de extinção da punibilidade pelo cumprimento, com a exclusiva finalidade de obstar o recebimento de novo benefício durante o referido prazo.
Art. 14. O Corregedor Nacional poderá delegar a juízes auxiliares atos de conciliação e de mediação entre os envolvidos, bem como as tratativas para a celebração do TAC, homologando, posteriormente, o instrumento ajustado.
Art. 15. Poderão ser delegados às corregedorias gerais e regionais os atos de celebração, homologação e de acompanhamento do cumprimento do TAC ou somente os de acompanhamento de seu cumprimento, com comunicação posterior à Corregedoria Nacional de Justiça, nos termos do art. 28 da Resolução CNJ n. 135/2011.
Art. 16. A celebração de TAC pelo investigado e a participação dos interessados em audiência de conciliação ou mediação independem de constituição de advogado.
Art. 17. Os tribunais poderão celebrar TAC com magistrados, observadas, no que couber, as disposições deste Provimento, com comunicação à Corregedoria Nacional de Justiça, na forma do art. 28 da Resolução CNJ n. 135/2011.
Art. 18. Aplica-se este Provimento, no que couber, à(s) falta(s) cometida(s) por delegatários de serviços notariais e de registro, desde que se trate de infração disciplinar de reduzido potencial de lesividade aos deveres de conduta elencados no art. 31 da Lei n. 8.935/1994, dos quais se anteveja a aplicação de penalidade de repreensão ou multa.
§ 1º O órgão julgador ou a autoridade julgadora que entender conveniente celebrar TAC com o delegatário deverá buscar solução proporcional, equânime, eficiente e compatível com os interesses gerais e com a irregularidade constatada.
§ 2º Na análise da adequação e da conveniência do TAC, a autoridade considerará, entre outros elementos, o objetivo de eliminar irregularidades, incerteza jurídica, situações potencialmente contenciosas ou atentatórias às instituições notariais e de registro, bem como de estabelecer a compensação por benefícios indevidos ou prejuízos, públicos ou privados, resultantes das condutas praticadas.
§ 3º O instrumento do TAC deverá conter:
a) as obrigações do delegatário, que podem envolver, a partir do exame ponderado da autoridade competente, à luz da infração disciplinar e circunstâncias em que cometida, da realidade local e da capacidade econômica da serventia, dentre outras possíveis soluções, melhorias na prestação dos serviços ou instalações da serventia, qualificação do celebrante, estabelecimento de participação e aproveitamento em curso que tenha utilidade para as atividades cartorárias e/ou oferecimento de curso de qualificação aos empregados;
b) o prazo e o modo para cumprimento;
c) a forma de fiscalização quanto à sua observância; e
d) os fundamentos de fato e de direito.
Art. 19. Aplicam-se, no que couber, a faltas disciplinares cometidas por magistrados e por delegatários de serviços notariais e de registro, as disposições referentes a instrumentos de solução adequada de conflitos previstas na Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, no Código de Processo Penal, no Código de Processo Civil, na Lei de Improbidade Administrativa e na Lei da Mediação.
Art. 20. Os tribunais disciplinarão a celebração de TAC com servidores do Poder Judiciário, levando-se em consideração as normas federais aplicáveis e os respectivos regimes jurídicos.
Art. 21. O Livro I da Parte Geral do Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça – Foro Extrajudicial (CNN/CN/CNJ-Extra), instituído pelo Provimento n. 149, de 30 de agosto de 2023, fica acrescido com o seguinte Título VII:
“TÍTULO VII
DO REGIME DISCIPLINAR
CAPÍTULO I
TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA COM O CNJ
Art. 135-A. Aplica-se aos delegatários de serviços notariais e de registro o disposto no Provimento n. 162, de 11 de março de 2024, que trata da celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).”
Art. 22. Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação.
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO
Corregedor Nacional de Justiça
Fonte: CNJ